Podemos esperar alguma coisa da CoP-17?
Cheguei sexta-feira em Durban, África do Sul, para acompanhar a 17ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro da ONU sobre Mudança do Clima (CoP-17), que começa amanhã – minha primeira vez na África e minha quinta CoP (isso não significa que eu não ache complexo o processo das negociações)!
Ninguém sabe muito o que esperar dessa CoP após a decepção de Copenhague (CoP-15) em 2009 e o relativo sucesso de Cancún (CoP-16) no ano passado. No México, na verdade, os principais elementos do Acordo de Copenhague (Copenhagen Accord) acordado pelos países do BASIC (Brasil, África do Sul, Índia e China) e Estados Unidos no último dia da CoP-15 e rejeitados pela plenária final foram incorporados no processo das negociações por meio dos Acordos de Cancun (Cancun Agreements) após um ano de conversas para restaurar a confiança dos países. Esse ano, marcado pela crise econômica na Europa e Estados Unidos e com a mídia e a opinião pública saturados com a ausência de boas notícias no front de combate às mudanças climáticas, a tentativa de esvaziamento do processo multilateral de negociações da ONU por alguns países é uma realidade que não pode passar sem ser notada. E é por isso que devemos prestar atenção em tudo que está acontecendo por aqui.
Apesar das evidências científicas cada vez mais alarmantes (o IPCC publicou recentemente um relatório que relaciona os eventos climáticos extremos atuais com as mudanças climáticas), continuamos sem saber o que vai acontecer com o Protocolo de Quioto (PK), já que seu primeiro período de compromisso de quatro anos termina em dezembro de 2012. O PK é o único instrumento legal que obriga e estabelece metas para os países desenvolvidos reduzirem suas emissões de gases de efeito estufa e, por isso, muito defendido pelos países em desenvolvimento. Japão, Rússia e Canadá são contra um possível segundo período de compromisso e defendem que o PK seja substituído por um acordo que abranja tanto países desenvolvidos quanto países em desenvolvimento. Os Estados Unidos, que não fazem parte do PK, condicionam sua participação em um novo acordo legalmente vinculante de combate às mudanças climáticas que não só tenha a participação dos grandes emissores (principalmente a China – maior emissor atual), mas também que todos sejam tratados igualmente, exceto os países menos desenvolvidos. A União Europeia aceita um segundo período de compromissos, contanto que seja iniciado processo de negociação de acordo legalmente vinculante para os outros países.
Outro tema importante da CoP-17 é a transferência de recursos financeiros de países desenvolvidos para países que já estão sofrendo com as mudanças climáticas, mas não possuem recursos para adaptação e mitigação. As discussões do Fundo Verde Climático, estabelecido na CoP-16, deveriam estar bem mais avançadas, mas sua operacionalização ainda está em discussão. Além disso, de nada adianta estabelecer o Fundo sem dinheiro e sem saber da onde vêm esses recursos de maneira previsível!
Os compromissos de redução de emissões de gases de efeito estufa dos países desenvolvidos permanecem muito aquém do necessário para evitar mudanças climáticas catastróficas. Percebemos que a política não caminha lado a lado com a ciência quando vemos que, de acordo com as promessas de redução atuais, caminhamos para um mundo com um aumento de mais de 4ºC de temperatura!
Espero para a CoP-17 o mesmo que esperava para as outras CoPs, mas que, infelizmente, não se concretizou: que os países cooperem por um acordo, não importa se com o Protocolo de Quioto ou não, que realmente lance as bases para o combate eficaz das mudanças climáticas, que respeite a ciência e a justiça. Não será dessa vez ainda que veremos os países acordando um acordo justo, ambicioso e legalmente vinculante, porém, a CoP-17 pode ser catalisadora de um processo que nos levará a esse acordo. Se num passado não tão distante assim, esperava-se que esse acordo fosse produzido em 2009, agora o horizonte é 2015. Muitos países falam em 2020, mas esses parecem ignorar a urgência do problema.
Com inundações e secas cada vez mais frequentes, aumento do nível do mar e estações imprevisíveis, dos 28 países que figuram na lista da ONU como os mais vulneráveis às mudanças climáticas, 22 estão no continente africano, tornando a África uma vitrine dessa urgência por ação. Apesar dessa dura realidade, os jovens africanos que participaram da Conferência da Juventudo pré-CoP (COY-7) compartilharam sua alegria, otimismo e perseverança por meio da música.
Como acompanhar a CoP-17?
Na verdade, a CoP-17 em si abrange uma série de reuniões que acontecem paralelamente no mesmo lugar, mas com agendas diferentes que se relacionam. São elas: 7ª reunião das partes do Protocolo de Quioto (CoP/MoP-7), 35ª sessões do Órgão Subsidiário para Apoio Técnico e Científico (SBSTA 35) e do Órgão Subsidiário para Implementação (SBI 36), Quarta parte da 16ª sessão do Grupo de Trabalho Ad Hoc sobre Compromissos Adicionais no âmbito do Protocolo de Quioto para os Países do Anexo I (AWG-KP 16-4) e Quarta parte da 14ª Grupo de Trabalho Ad Hoc sobre Ação Cooperativa de Longo Prazo no âmbito da Convenção (AWG-LCA 14-4). Além disso, no mesmo lugar onde ocorrem as negociações formais, acontecem uma série de eventos paralelos.
Abaixo, segue uma breve descrição de cada um desses órgãos que compõem a Convenção do Clima:
CoP – Órgão supremo da Convenção, controla sua implementação, analisa as Comunicações Nacionais e inventários das emissões e o progresso na direção do objetivo maior da Convenção. Reúne-se anualmente em Bonn, a não ser que um dos países Partes da Convenção se ofereça para sediar o encontro, como foi o caso da África do Sul em 2011.
CoP/MoP – Reúne-se durante o mesmo período da CoP. Suas responsabilidades são similares às da CoP, mas no âmbito do Protocolo de Quioto.
SBI – Oferece conselhos à CoP sobre todas as questões referentes à sua implementação: examina as Comunicações Nacionais, os Inventários para avaliar o sucesso da implementação da Convenção, acompanha a efetividade dos recursos financeiros para países Não-Anexo I, e guias de orientação para os mecanismos financeiros operados pelo GEF.
SBSTA – Fornece à CoP conselhos sobre questões científicas, tecnológicas e metodológicas. Trabalha em estreita colaboração com o IPCC. Promove o desenvolvimento e transferência de tecnologias ambientalmente corretas e facilita, tecnicamente, guias de orientação para elaboração dos inventários e Comunicações Nacionais.
AWG-LCA – Foi estabelecido pela CoP-13 (2007), em Bali, para ser um processo de acompanhamento do diálogo sobre ação cooperativa de longo prazo para abordar mudança de clima ampliando a implantação da Convenção, buscando a participação ativa de países em desenvolvimento com emissões de gases de efeito estufa em crescimento, além dos Estados Unidos. Este órgão subsidiário temporário recebeu um mandato para inaugurar um processo para assegurar a plena, efetiva e sustentada implementação da Convenção por meio de ação cooperativa de longo prazo até e para além de 2012. O AWG-LCA deveria ter concluído seu trabalho até a CoP-15 (2009), porém seu mandato tem sido estendido pela CoP desde então.
AWG-KP – Foi estabelecido na CoP/MoP-1 (2005), em Montreal, a partir do artigo 3.9 do Protocolo de Quioto (PK), que diz que os países-parte do PK devem considerar compromissos adicionais pelo menos sete anos antes do final do primeiro período de compromisso (2008-2012), ou seja, uma meta de redução de gases de efeito estufa mais ambiciosa pelos países desenvolvidos. Seu trabalho também deveria ter sido concluído em 2009.
Além de acompanhar o blog do Adopt a negotiator, você pode buscar mais informações nos seguintes links:
Documentos básicos:
1) Programa diário (Daily Programme) – Programação oficial da CoP-17, incluindo reuniões de negociação que são abertas a observadores, reuniões de grupos de países (G77+China, Grupo Africano, Aliança dos Pequenos Países Insulares, Umbrella Group, Países Menos Desenvolvidos, etc), reuniões de organizações observadoras (jovens, povos indígenas, organizações do setor privado, sindicatos, organizações ambientalistas, etc), coletivas de imprensa, anúncios, eventos paralelos.
Além disso, os documentos em discussão podem ser encontrados no site oficial da Convenção de Clima (UNFCCC) http://unfccc.int/meetings/durban_nov_2011/meeting/6245/php/view/documents.php
2) Earth Negotiations Bulletin – Boletim neutro produzido pelo IISD relatando o que aconteceu no dia anterior nas negociações (2 páginas, geralmente)
3) ECO – Boletim produzido pela Climate Action Network (CAN), rede de ONGs ambientalistas, que tem por objetivo destacar os pontos que precisam avançar nas negociações e apontar quem tem que fazer o quê. Possui de 2 a 4 páginas e é escrito em tom irônico.
Vídeos
CoP-17 ao vivo transmitida pelo site oficial do evento
One Climate – Cobertura online e entrevistas direto da CoP-17
Twitter:
Lista de brasileiros presentes na CoP-17 (por favor, escreva para @jrussar se estiver por aqui e não estiver na lista)
Tweets ao vivo direto das negociações pela equipe do Adopt a negotiator




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ceruru
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http://tcktcktck.org/2011/11/the-daily-tck-28-november-2011/ TckTckTck »The Daily Tck: 28 November 2011 : The Global Campaign for Climate Action
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http://tcktcktck.org/2011/11/the-daily-tck-29-nov-2011/ TckTckTck »The Daily Tck: 29 Nov 2011 : The Global Campaign for Climate Action
About the author
Juliana RussarApaixonada por política internacional e desenvolvimento sustentável. Sou formada em Relações Internacionais, tenho 26 anos, vivo em São Paulo e atualmente sou coordenadora da 350.org Brasil e faço parte do programa Oxfam International Youth Partnerships. Acompanho as negociações desde 2007. Essa é a minha quinta Conferência das Partes.